sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Sobre porcos e meninas

A boa notícia dos últimos dias é que está confirmada a vinda do meu pai e da minha madrasta para o Paquistão em fevereiro. Antes disso, no final de janeiro, vamos passar 10 dias em Istambul (estou animadíssima para Istambul!). Conversando com eles, fiquei pensando sobre o que eu gostaria que eles me trouxessem. Uma coisa que eu nunca vi por aqui é meia-calça. Parece estranho, mas acho que faz sentido porque a roupa tradicional das mulheres aqui é composta por uma calça e uma bata, ninguém usa saia. Por incrível que pareça, outra coisa que sinto falta aqui é sal e açúcar de qualidade. Tanto o sal quanto o açúcar são muito grossos e não dissolvem direito. As comidas em geral são apimentadas, mas têm pouco sal. Falando em comida, nada faz mais falta que queijo de qualidade e porco (e acredito que a imensa maioria dos estrangeiros que reside aqui vai dizer a mesma coisa). Eu nunca pensei que fosse sentir tanta falta de carne de porco, mas esse artigo é proibido no país, assim como em outros países islâmicos. O porco é considerado um animal sujo. 

Faz uma falta incrível não ter linguiça, salame, presunto. Uma das poucas coisas que eu trouxe quando voltei de Berlim foi justamente salame e queijo. Aqui tem bons queijos de cabra, mas queijo amarelo não tem, só parmesão. Faz uma falta danada. Vocês não têm ideia da alegria do pessoal quando vamos jantar na casa de alguém que tem um bom queijo e algum produto feito de porco. Portanto, lembrem-se, se vierem ao Paquistão, tragam porco! Precisamos urgentemente de um traficante de porco (ouvi dizer que isso existe no Irã. Sério.). O engraçado é que no Brasil eu não comia muito presunto ou bacon, pois sempre preferi peito de peru. Mas, por alguma razão misteriosa, os produtos feitos com peru são horrorosos por aqui. Pode até ser que sejam saborosos, mas a cara não é nada animadora e por isso até agora achei melhor não experimentar.

Eu estava pensando sobre essas limitações na terça-feira de noite, quando aconteceu algo terrível não muito longe de Islamabade. Uma menina de 14 anos foi baleada por terroristas do Talibã paquistanês, que, orgulhosos da ação, assumiram a responsabilidade do ato. O motivo? A menina é conhecida nacionalmente por ter defendido nos últimos anos o acesso das mulheres à educação por meio de um blog. Os terroristas seguiram a van onde ela estava, perguntaram por ela e atiraram à queima-roupa. Não sei como ela sobreviveu, mas felizmente não corre mais risco de morte, embora siga internada no hospital. Os terroristas ainda disseram que atacarão de novo caso ela sobreviva. Esses grupos dominam o norte do Paquistão, as chamadas zonas tribais, onde o governo do país pouco ou nada tem de soberania. A justiça e o cotidiano são definidos nas jirgas, assembleias de anciãos. Não é muito difícil imaginar que são grupos extremamente conservadores.

Não é fácil viver num país onde meninas de 14 anos são baleadas por quererem ir ao colégio, mas como ainda tenho muito tempo pela frente por aqui... é melhor pensar que limitação mesmo é não ter carne de porco para comer no jantar.

2 comentários:

  1. A notícia do atentado a essa menina também foi notícia aqui. Inclusive nos jornais saíram fotos de protestos de outras meninas contra o ato. E na imprensa paquistanesa como é tratado?
    Beijo
    Zeza

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  2. A repercusão foi muito negativa. Os principais jornais foram muito críticos ao episódio, e os comentários dos leitores nas matérias também. Eu normalmente acompanho esses dois jornais: http://tribune.com.pk/ e http://dawn.com/

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